terça-feira, 13 de março de 2018

Confiança é a palavra-chave para uma adaptação escolar bem-sucedida

Os pais precisam confiar na instituição de ensino onde os filhos vão iniciar sua vida escolar para transmitir segurança e tranquilidade aos pequenos

Visita a casa da pequena Maria Eduarda
Quem nunca perdeu o sono pensando em como será a adaptação dos filhos na escola, principalmente nos primeiros 3 anos de vida? O assunto é recorrente entre mães, sejam nas situações em que precisam deixar os filhos na escola para voltar da licença-maternidade, ou então quando os pais querem que os filhos passem a conviver e interagir com outras crianças da mesma idade. Por mais decididos que os pais estejam com relação a essa escolha, um misto de sentimentos como medo, culpa e ansiedade toma conta e pode complicar ainda mais este momento.


O novo gera insegurança em qualquer idade, mas na educação infantil esse processo é ainda mais intenso. As crianças se veem em um ambiente coletivo com regras diferentes daquelas praticadas em casa, são estimuladas a participar de atividades incomuns e passam a conviver com adultos e crianças que até então não faziam parte de seu convívio. Para diminuir a ansiedade e os medos que essas mudanças podem trazer é muito importante um processo de adaptação bem-feito. É fundamental que os pais confiem na escola para que, assim, possam transmitir tranquilidade aos filhos.

De acordo com o artigo ‘O processo de adaptação da criança na creche: seu desenvolvimento afetivo, cognitivo e psicomotor’, o processo de adaptação de uma criança é determinado por diversos fatores e depende da participação de pais, educadores e instituição, como agentes facilitadores. “A entrada da criança na creche precisa ser pensada com muito cuidado pelos educadores, pois se configura como um momento de separação de seus pais ou de alguém que represente o papel social familiar. Se a adaptação for feita de maneira adequada, a permanência da criança na instituição de educação infantil tende a ser tranquila, o que colabora também para o seu crescimento afetivo, psicomotor, cognitivo e social”, conclui.

Segundo a psicopedagoga e mestre em distúrbios do desenvolvimento, Karen Kaufmann Sacchetto,
para que uma adaptação escolar ocorra da melhor maneira possível, precisa ser bem conduzida, minimizando sofrimentos desnecessários. “Quando nos preparamos para as situações, estas acabam sendo menos dolorosas do que se apresentavam. Quanto menor o filho, mais difícil parece a separação e maior a ansiedade dos pais. O bebê não fala e isso provoca nos pais um vazio, pois não têm o registro que gostariam de como foi aquele dia do ponto de vista do bebê.”, argumenta.

Diretora da Escola Paraíso da Criança, de São José do Inhacorá (RS), a especialista em gestão e organização escolar, Sandra Reckziegel, explica a maneira que considera ideal para fazer a primeira adaptação na escola. “Os pais precisam preparar a criança, deixá-la pouco tempo na escola no primeiro dia de aula e, gradualmente, aumentar este tempo a cada dia. Normalmente em até duas semanas a criança está totalmente adaptada e já fica no período integral”, explica. Este aumento gradual da permanência da criança no ambiente escolar é uma das formas mais adotadas para adaptação nas escolas infantis.

Outra maneira de adaptação escolar tem sido feita na escola Atuação, em Curitiba (PR), há oito anos. A diretora e psicopedagoga, Esther Cristina Pereira, explica que o método funciona da seguinte forma: alguns dias antes do início das aulas, cada aluno recebe em sua casa a visita da futura professora e da coordenadora pedagógica. Neste encontro, a educadora leva um boneco ou boneca devidamente uniformizado, que representa o aluno, conversa com os pais, tira fotos com a criança e a família. Essas imagens são impressas e inseridas em um mural que fica exposto na sala durante os primeiros dias de aula. “A foto serve como uma referência emocional para o aluno, que vai olhar para a imagem e se lembrar daquele momento em sua casa, o que exclui a ideia de total estranhamento ao chegar na escola”, afirma. Segundo Esther, o encontro com a criança e a família ajuda muito na adaptação dos pais também, já que eles aproveitam para tirar dúvidas e criar um vínculo com a escola.

De acordo com Esther, este modelo de adaptação escolar é comum na Finlândia. “Conhecemos em uma viagem que fizemos até lá e resolvemos implantar na nossa escola. O resultado tem sido adaptação mais leve, pais mais tranquilos e as crianças se sentem mais seguras porque não têm o impacto de chegar e encontrar uma professora totalmente desconhecida.”, revela.

Para Carolina Biscaia da Silva, mãe de Lucas, de 7 anos e Daniel, de 2, o método de adaptação da escola Atuação foi fundamental para a escolha da instituição há 5 anos. “Quando fui conhecer a escola fiquei sabendo como era feita a adaptação com a visita da professora em casa e isso me deu mais segurança.”, recorda. Segundo ela, este momento de integração cria um vínculo maior entre escola, família e criança. Quando iniciou as aulas, Lucas que, na época tinha 2 anos, já ficou no período integral desde o primeiro dia, sem choro e sem sofrimento. Agora é a vez do pequeno Daniel iniciar na escola. De acordo com Carolina, mesmo sendo mais apegado a ela, o primeiro dia na escola foi tranquilo e a expectativa é de que continue assim.

Contando com os resultados positivos deste processo, Marcela Gulak, mãe de Maria Fernanda, de 1 ano e 10 meses, está fazendo a adaptação da filha na escola. De acordo com ela, o fato de receber a professora em casa e ela poder interagir com a filha no ambiente em que está acostumada é muito importante. “No dia em que fui entregar o material na escola, levei minha filha junto e encontramos a professora. Quando ela viu saiu correndo para abraçar.”, comemora. Para Marcela esta estratégia de adaptação torna família e escola mais próximas.

Conforme o artigo ‘O ingresso e adaptação de bebês e crianças pequenas à creche: alguns aspectos críticos’, não existe muito consenso sobre o próprio conceito de adaptação a creche e, menos ainda sobre os fatores que estão associados a este processo e como os bebês enfrentam as situações estressantes deste período. O estudo diz que cada criança precisa de um período de tempo diferente para se adaptar, sendo importante respeitar o ritmo da própria criança e não impor um período pré-determinado para a adaptação.

De acordo com a psicopedagoga Karen, muitos pais têm um sentimento de culpa por não poderem estar o tempo que julgam ideal com seu filho. “Aqui vale a velha máxima ‘O que importa é a qualidade e não a quantidade do tempo que passam juntos’. Não há porque se sentir assim. As crianças crescem, amadurecem e precisam de novas experiências com outras da mesma idade.” Segundo ela, por mais longo e cheio de lágrimas, que um período de adaptação possa ser, não traumatiza. “Todos superam essas ‘dores’ dos primeiros dias na escola e, logo, eles farão parte de uma lembrança distante.”, defende.

Independente do método de adaptação oferecido pela escola é importante ter claro que trata-se de um processo complexo e gradual que depende da participação dos pais, filhos e instituição de ensino. Não existe um método 100% eficiente a prova de choro, ansiedade e medos porquê cada pessoa encara este momento de forma diferente. O importante é que os pais confiem na escola e que ambos respeitem o tempo que a criança precisa para se sentir totalmente confortável para que possa explorar e aproveitar todas as possibilidades que este momento tem a oferecer.

Matéria publicada no jornal Gazeta do Povo

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